Joyland – Stephen King

12 de julho de 2016 2 Por Fernando Rhenius

Estava em dúvida sobre qual obra de Stephen King iria ler. Após degustar Sobre a Escrita, minha concepção do autor mudou, melhorou. Fiquei mais fã. O livro, acaba sendo quase uma autobiografia. Aprendemos, ou tentamos pensar como ele. Aconselho a quem quer começar a acompanhar a obra de King ler Sobre a escrita. A construção dos personagens tem um outro significado.

Mas a escolha por Joyland não foi algo fácil. Estava dividido entre a história do parque de diversões e Revival. Acabei escolhendo a do parque, por ter apenas um exemplar na livraria, contra 10 do outro trabalho. Algo me dizia que a história iria me tocar, e assim o fez.

A publicação teve vida em 2013 nos EUA. King conta a história de Devin Jones, jovem universitário de 21 anos que após uma desilusão amorosa, tenta por um rumo na vida e principalmente no coração trabalhando em um parque de diversões modesto, chamado Joyland.

Devin ou Jonesy (como é chamado pelos colegas de parque), narra a história depois de muitos anos remoendo os acontecimentos. Ele na época é uma pessoa comum como qualquer um que tenha a sua idade. Sofre com a falta de amor, de Wendy Keegan. Ele não tem uma personalidade forte, é calmo para não dizer acanhado. Seus pensamentos giram em torno da menina que tanto ama, mesmo sabendo que o relacionamento acabou, ele insiste. Pensa, manda cartas, liga. No fundo sabe que a coisa realmente chegou ao fim. Como todo ser humano sempre crê no melhor e sonha em ter o devido reconhecimento.

Empenhado em esquecer ou abrandar o coração, Jonesy acaba trabalhando no parque. Primeiro como um serviço de férias, depois por todo o inverno. Trancar a faculdade não foi uma decisão fácil de ser tomada. O principal objetivo era esquecer Wendy.

Assim como em outras obras de King, a profissão dos sonhos do protagonista é ser escritor. Para Jonesy, o ideal de vida, além dos livros, e ter o trabalho publicado no jornal The New Yorker.

Eu já tinha planejado tudo. Claro que também tinha planejado me casar com Wendy Keegan e que esperaríamos até os trinta e poucos anos para ter dois filhos. Quando se tem vinte e um anos, a vida é um mapa rodoviário. Só quando se chega aos vinte e cinco, mais ou menos, é que se começa a desconfiar que estávamos olhando para o mapa de cabeça para baixo, e apenas aos quarenta temos certeza absoluta disso. Quando se chega aos sessenta, vai por mim, já se está completamente perdido. Página 20.

Tudo gira em torno do parque e seus personagens. O dono, um senhor quase centenário que acaba fisgando Jonesy, o chefe prestativo, o encarregado resmungão, além da moça que acredita prever o futuro.

Seja em um parque, um mercado ou um hotel. Ambientes coletivos, muitas vezes sem sal, se transformam em lugares sombrios e frios. Em Joyland não é diferente. Wendy era o principal motivo para Jonesy querer passar mais tempo trabalhando no parque, mas algo a mais tinha ali, além da roda gigante ou montanha russa.

Joyland foi o cenário para a morte de Linda Gray. A bela jovem perdeu a vida em uma das principais atrações de qualquer parque de diversão, o trem fantasma. Ver o espírito de Linda se tornou uma obsessão por parte do jovem, mas ele não tinha a sorte de outras pessoas que sentiam o frio e energia negativa presentes no brinquedo onde a moça foi morta.

Em edição especial nos EUA, livro conta com mapa de Joyland. (Foto: Divulgação)

Além de não sentir o fantasma, o assassino nunca foi encontrado. Seria ele um serial killer? Um marido ou namorado enciumado? Ou um ladrão que teve mais dificuldade em roubar algo?

História é a merda coletiva e ancestral da raça humana, uma grande e crescente pilha de merda. Agora, estamos no topo dela, mas em pouco tempo vamos estar enterrados na caca de gerações que ainda virão. É por isso que as roupa dos pais de vocês parecem tão engraçadas nas fotos, só para citar um exemplo. E, como alguém destinado a ser enterrado na merda de seus filhos e netos. Acho que vocês deveriam ser um pouquiiiinho mais tolerantes. Página 51/52.

Tudo isso povoa a cabeça do jovem rapaz. A primeira parte do livro pode ser considerada chata para quem está ávido em descobrir o fim da trama. Grande parte do livro conta a rotina de Jonesy e seus amigos no parque. Sua vida na pensão em que está hospedado. Mesmo podendo ser algo parado para alguns, é fundamental para traçar um perfil dos personagens. Todos pode ter matado Linda, mas quem e porquê?

Claro que todos querem saber quem matou Linda Gray. Mesmo este não sendo um livro de terror, King sempre dá seu toque sobrenatural. Assim Jonesy conhece Mike, uma criança que passa os dias em uma cadeira de rodas por conta de uma distrofia muscular.

Mike vê coisas, Mike vê mortos. Sua mãe a incrédula Annie, credita tais “fantasmas” a saúde debilitada do filho, o que mais séria? Esta parte do livro é especial. Quem tem filhos sabe as dificuldades em cuidar quando estão em seus primeiros anos. Ter filhos com problemas graves faz dos pais anjos da guarda em tempo integral. Acompanhar o dia a dia de Mike, seus sonhos limitados pela doença, sua vontade de conseguir coisas simples e ter a incrível força de vontade emociona.

Já faz muito tempo que não, e eu só voltei a vir para cá porque Mike adora o lugar. Ás vezes, consigo encarar o fato de que é quase certo que ele vá morrer, mas em geral não consigo. Apenas afasto o pensamento. Faço acordos comigo mesmo. “Se eu não levá-lo a Joyland, ele não vai morrer. Se eu não fizer as pazes com meu pai para ele que visite Mike, ele não vai morrer. Se ficarmos aqui, ele não vai morrer.” Duas semanas atrás, na primeira vez que precisei mandá-lo colocar o casaco para ir à praia, eu chorei. Ele me perguntou qual era o problema, e falei que era aquela época do mês. Ele sabe o que é.

Eu me lembrei de algo que Mike tinha dito a ela no estacionamento do hospital: Não tem que ser nosso último momento feliz. Mas, cedo ou tarde, o último momento feliz chegaria. Chega para todo mundo. Página 206.

Jonesy cria um importante e paternal vínculo com Mike e sua mãe Annie. Talvez pela carência de ter lavado um fora da namorada, ou pela sinergia que o garoto tem em relação ao fantasma de Linda Gray. Esta parte, além de torcer para que Jonesy tenha alguma coisa com a mãe de Mike e tire a sem sal da Wendy do coração, King mostra partes importantes da morte no parque.

O final da história, é diferente do que se espera de um suspense. Tudo é revelado, mas acaba ficando em segundo plano. Não que ela não merecia ter o seu devido espaço, mas em um mundo de mortes e dor o óbvio nem sempre é o melhor final. Ele emociona, te faz chorar e se lamentar que o livro tem apenas 238 páginas.

Quem está acostumado com os calhamaços que Stephen King escreve, pode olhar com descrédito o livro frente a títulos mais famosos e maiores. Mas não se engane, a história é boa, vai te obrigar, no bom sentido a ler de uma só vez. Por trabalhos como esse que Stephen King é Stephen King.

Joyland

Tradução: Regiane Winarski

Suspense

ISBN: 9788581052984

Lançamento: 05/07/2015

Formato: 16 x 23

240 páginas

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